quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Pra lembrar o mote: Toda casa de taipa abandonada, guarda um grito de fome dentro dela...

Resultado de imagem para casa de taipa abandonada

Visitei meu sertão de ponta a ponta
Só pra ver o casebre onde morei
A porteira na frente eu avistei
Só o mato que fez tomar de conta
Minha ânsia no peito estava pronta
Pra dizer quero ver o jeito dela
Minha casa na frente era amarela
Mas com o tempo, a cor é desbotada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

Foi papai quem caiou a sua frente
Quando a chuva passou despercebida
Tendo água melhora a nossa vida
Fica a terra molhada ao invés de quente
Depois passa essa chuva derepente
E a seca ocupando o lugar dela
Deixa a vaca mais gorda magricela
E o leite não dá pra meninada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela 

Sem comida, sem pão e sem inverno
Na casinha de barro do roceiro
Não tem mais as galinhas no terreiro
E a mata vestindo um novo terno
Desse jeito o sertão vira um inferno
Foi assim que deixei de morar nela
Pai vendeu o cavalo e sua sela
E depois levou nós pela estrada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

Eu voltei com saudades do recinto
Do viver da pequena moradia
Mas eu vi dentro dela a agonia
Que essa dor que bateu ainda sinto
É verdade, eu chorei, pois eu não minto
Quando vi o pedaço da tigela
A chinela que mãe calçava ela
E caindo um pedaço da latada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

Escutei um gemido lá no quarto
Mas só vi rachadura no oitão
Vi quebrada a mão velha do pilão
Vi rasgado um pedalo de um retrato
Era uma casa de taipa lá no mato
Que pra mim era pobre mais singela
Eu, papai e mamãe morava nela
Mas a casa hoje está quase arriada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

Ô saudade do pé de cajarana
Que ficava no fundo do quintal
Ô saudade do gado no curral
Do engenho e papai moendo cana
A saudade que eu sinto é mais tirana
Que espinha furando a minha goela
Sei que o tempo torou sua tramela
E de porta não tem é quase nada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

Vi um vulto passando pra cozinha
Eu lembrei de mamãe lá no fogão
Eu lembrei do comer no caldeirão
E do caco de mãe deitar galinha
Mas eu vi que a acasa que era minha
No passado eu queria viver nela
Sei que hoje não tem mais nem janela
E o cupim na madeira faz morada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

Vi a casa que estava no abandono
E chorei sem saber o que fazer
Com a terra sem água pra beber
Deixa o pobre roceiro sem ter sono
E a casa sem vida sem ter dono
Faz o pobre chorar junto com ela
Mas eu posso dizer morei naquela
Que hoje em dia o fantasma faz morada
Toda casa de taipa abandonada
Guarda um grito de fome dentro dela

(Lalauzinho de Lalau)

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